Prédio Vazio

Crítica – Prédio Vazio

Sinopse (imdb): Luna, uma jovem determinada, busca sua mãe que sumiu misteriosamente no último dia de Carnaval em Guarapari. Sua procura a leva até um prédio antigo, aparentemente vazio, mas repleto de almas atormentadas.

Ueba! Filme novo do Rodrigo Aragão, e desta vez no circuito!

Se você já conhece a obra do Rodrigo Aragão, pode pular este parágrafo. Se não conhece, chega aqui: Aragão é, provavelmente, o maior nome do cinema de terror feito no Brasil hoje em dia. Este é o seu sexto longa metragem desde 2008, depois de Mangue Negro, A Noite do Chupacabras, Mar Negro, Mata Negra e O Cemitério das Almas Perdidas, além de ter organizado o longa em episódios Fábulas Negras (todos têm textos aqui no heuvi). Tem gente por aí que acha que não existe terror feito no Brasil. Tem gente por aí que deveria conhecer o trabalho dele.

Cinco anos depois de seu último longa, Aragão fez seu primeiro terror “urbano” – pela primeira vez ele filmou numa cidade grande. Aragão morou na Praia do Morro, em Guarapari, local onde se passa o filme, e quando caminhava pelo calçadão à noite, às vezes via prédios quase totalmente apagados, com um ou dois apartamentos acesos. E ele imaginava como seria estar num prédio daqueles, quase vazios. Daí surgiu a ideia para o filme.

Curioso é que o roteiro teve vários tratamentos. Inclusive teve uma versão mais “clean” feita com a ajuda de um gringo, que seria facilmente vendável para uma Netflix da vida. Mas Aragão desistiu deste tratamento e voltou para uma versão anterior, mais puxada pro trash – mais a ver com o estilo dos seus outros filmes.

Prédio Vazio é urbano, mas é coerente com o resto da obra do diretor. Claras influências de Sam Raimi, Dario Argento e Zé do Caixão, tudo isso com uma pitada de trash por cima.

Curioso que o filme se passa num bairro real de Guarapari, mas o prédio onde tudo acontece não existe. O diretor falou que tentou filmar em um prédio já existente, mas diante das dificuldades de conseguir autorizações, desistiu e construiu uma maquete. Ficou boa, parece um prédio velho e caquético.

Aliás, uma curiosidade dita pelo próprio Rodrigo Aragão em um bate papo pós filme no Estação Botafogo: o longa abre com um filminho publicitário turístico sobre Guarapari, feito décadas atrás, e guardado pelo pai do diretor, que trabalhava num cinema. Só trocaram a narração, originalmente feita pelo Cid Moreira, o resto do filminho está lá na introdução.

A história é simples, uma jovem vai procurar a mãe que estava hospedada na Praia do Morro, mas quando chega no prédio, descobre que tem algo de errado lá. E claro que isso abre espaço para muitos efeitos práticos, muito sangue cenográfico, e muitos truques de maquiagem.

Aliás, uma dica pra quem gosta de procurar coisas escondidas nos filmes: assim como acontece na série A Maldição da Residência Hill, Prédio Vazio tem vários fantasmas escondidos pelos cenários. Deu vontade de rever só pra procurá-los. Isso sem contar nos easter eggs do “Aragãoverso”, como o livro de São Cipriano que estava no Cemitério das Almas Perdidas.

Sobre o elenco, Gilda Nomacce está ótima, ela acabou virando um grande nome no terror brasileiro contemporâneo (ela estava em filmes da dupla Marco Dutra e Juliana Rojas, como Trabalhar Cansa, As Boas Maneiras e Quando eu Era Vivo). Também gostei muito do jovem Caio Macedo, meio alívio cômico, meio “donzelo em perigo”.

Nem tudo é perfeito. Algumas atuações não são tão boas, e as cenas de lutas entre os personagens não são muito bem filmadas. Mas a gente está acostumado a ver terror hollywoodiano bem pior que esse e não fala mal…

Por fim, se você apoia o cinema nacional, e se você quer ver mais terror feito no Brasil, vá ao cinema esta semana. É difícil quando um filme desses entra em circuito. Precisamos prestigiar!

Until Dawn: Noite de Terror

Crítica – Until Dawn: Noite de Terror

Sinopse (imdb): Um grupo de amigos presos em um loop temporal, onde inimigos misteriosos os perseguem e os matam de maneiras terríveis, devem sobreviver até o amanhecer para escapar.

Antes de tudo, aquele aviso que quem me conhece já sabe: não sou ligado em videogames. Nunca tinha ouvido falar desse jogo. Os meus comentários serão só sobre o filme, ok?

Until Dawn: Noite de Terror (Until Dawn, no original) não teve sessão de imprensa aqui no Rio (ou se teve, não fui chamado). Heu achei que ia ser mais um filme de terror genérico e irrelevante, então eu deixei pra lá. Até que li em algum lugar que era um filme que usava loop temporal, e heu gosto muito deste sub gênero. Então, mesmo atrasado, fui ver.

Cinco jovens estão procurando uma amiga que desapareceu. Chegam em uma cabana isolada onde coisas muito estranhas vão acontecer. Os cinco acabam mortos, mas eles logo voltam ao mesmo momento de quando chegaram na cabana.

Ok, é um loop temporal. Mas não é exatamente o loop temporal que a gente está acostumado, que é quando o personagem volta e revive exatamente a mesma rotina (e que foi bem explorado no bom A Morte te Dá Parabéns). Aqui não existe  um padrão, cada vez que o dia recomeça são novos desafios que eles têm que enfrentar.

A direção é de David F. Sandberg, que chamou a atenção com o excelente curta Lights Out, mas que quando começou a fazer longas ainda está no “quase” – seu currículo tem alguns filmes ok, mas nenhum grande filme (Annabelle 2, Shazam). Ah, tem uma cena que lembra o seu famoso curta. No elenco, vários jovens irrelevantes. Ninguém é péssimo, mas também ninguém é bom. O único nome conhecido é Peter Stormare, num papel menor, porém importante.

Until Dawn tem pontos positivos e negativos, vou começar pelos positivos. Heu não conhecia nada da história e me vi envolvido no mistério onde os jovens se metem. São mortes criativas, alguns jump scares bem bolados, efeitos especiais ok – nada que eleve o filme a um patamar de “imperdível”, mas pelo menos a trama conduz o espectador para momentos divertidos.

Mas, por outro lado, achei tudo meio bagunçado. Às vezes é um único vilão, outras vezes tem vários; às vezes é um monstro, outras vezes é outro… No videogame isso deve fazer mais sentido, mas aqui achei que fez falta um antagonista, um “personagem vilão slasher”, tipo um Jason, um Freddie, um Michael… Pelo que entendi pelo cartaz do filme, que diz “toda noite um pesadelo diferente”, no universo do jogo deve ser mais amplo. Legal, mas aqui ficou solto demais. Por exemplo, pra que mostrar um monstro gigante na floresta se ele não vai aparecer nunca mais no filme?

(Claro, a gente vê esse filme e lembra de O Segredo da Cabana, que também tem uma cabana isolada e cinco jovens, e também não segue exatamente um padrão. Mas O Segredo da Cabana é MUITO melhor estruturado.)

Além disso, o final é ainda mais bagunçado. Achei bem forçado – e bem ruim, na verdade.

Quando acabou o filme, a sensação era de ter me divertido. Mas conforme ia organizando as ideias pra desenvolver meu texto aqui, o filme ia piorando. Acho que Until Dawn pode ser uma boa diversão, mas sugiro não parar pra pensar depois de assistir.

Como Treinar o seu Dragão (live action)

Crítica – Como Treinar o seu Dragão (live action)

Sinopse (imdb): Quando uma ameaça coloca em perigo tanto vikings quanto dragões na ilha de Berk, a amizade entre Soluço, um viking inventivo, e Banguela, um dragão Fúria da Noite, se torna a chave para ambas as espécies construírem um novo futuro juntas.

Falei aqui outro dia sobre Lilo & Stitch, live action quase igual ao desenho original. Poizé, Como Treinar o seu Dragão é a mesma coisa. Quase igual ao desenho original. Deu vontade de ser preguiçoso e copiar o meu texto sobre o longa animado, de 2010. Mas, vamulá, o leitor merece um novo texto.

Estamos vivendo uma onda de adaptações live action, mas é quase tudo Disney (este ano já foram duas, Branca de Neve e Lilo & Stitch). Mas aqui não é Disney, Como Treinar o seu Dragão é o primeiro live action da Dreamworks. A direção é do mesmo Dean DeBlois que co-dirigiu a animação (Chris Sanders foi o parceiro no desenho, mas não está neste filme, ano passado ele fez Robô Selvagem). Curiosidades do mercado cinematográfico: além de Como Treinar o seu Dragão, a dupla também dirigiu o Lilo & Stitch original. Já reparou que o Banguela e o Stitch são um pouco parecidos?

No filme, o jovem Soluço, filho do líder de uma aldeia viking que é frequentemente atacada por dragões, tenta capturar um dragão Fúria da Noite, o mais perigoso de todos, mas quando consegue, acaba se afeiçoando ao animal.

A história é igual, dragões vs humanos, humanos vs dragões, até que um humano descobre que as espécies podem conviver pacificamente. Mas existe um problema quando você troca de animação pra atores reais. Porque se um dragão cospe fogo em um personagem desenhado, dependendo de como isso for apresentado, isso pode ser algo engraçadinho. Mas com atores humanos, fica muito mais violento. Fiquei preocupado em uma cena onde um dragão solta labaredas em cima da plateia da arena, ia ter gente morrendo ali. Mas é filme pra criança, então dragões atacam casas e barcos, humanos caçam dragões, mas no fim ninguém se machuca, nem humanos, nem dragões.

Tem outro problema que é a “polêmica desnecessária da vez”. São vikings, e escolheram Nico Parker, uma atriz de ascendência negra, para o principal papel feminino – apesar dela ter olhos claros e a pele bem mais clara que a da sua mãe, Thandiwe Newton. Ela não é uma atriz ruim, mas, fica aquela dúvida: precisava? Se no desenho era uma menina loira, pra que alterar? É o tipo da provocação que só serve pra alimentar polêmicas, na minha humilde opinião.

Pelo menos o filme apresenta um exuberante espetáculo visual, assim como acontece na animação – li que foi filmado na Islândia, nas mesmas paisagens onde se inspiraram pra fazer a animação. Além disso, os efeitos de cgi dos dragões são perfeitos. Quase dá pra acreditar que são reais.

No papel principal, temos o jovem Mason Thames, que já tinha mostrado talento em O Telefone Preto – esse garoto vai longe! Nico Parker faz a principal personagem feminina, como falei, ela está bem, só achei que podiam ter escolhido uma atriz mais parecida com a do desenho (como o resto do elenco). Gerard Butler repete o papel que fez na animação, o pai do protagonist; Nick Frost também está bem, não o reconheci logo de cara, mas fiquei pensando “esse cara parece o Nick Frost…”.

Dito tudo isso, volto ao ponto de partida. Como Treinar o seu Dragão não é ruim, mas é igual ao desenho, então a gente pode pensar que é um filme desnecessário. Mas vou lembrar da minha reflexão de dias atrás, sobre Lilo & Stitch: se Como Treinar o seu Dragão trouxer público para o cinema, tá valendo.

Que traga muito público. A continuação já está prevista para 2027.

Consertando Andor – Segunda Temporada

Consertando Andor – Segunda Temporada

Andor foi um dos melhores produtos de Star Wars desde a compra pela Disney. Vou além: a primeira temporada de Andor pode figurar entre os melhores produtos de todos os filmes e séries de Star Wars, desde o primeiro filme, em 1977. Andor era mencionado como “Star Wars para adultos” – uma história séria, com tema político, situada no universo de Star Wars, mas sem Jedi, sem sabre de luz, sem ewoks e gungans.

A primeira temporada foi realmente muito boa. Ia ser difícil fazer uma segunda do mesmo nível. E infelizmente aconteceu o esperado: a segunda temporada está longe de ser ruim, mas decepcionou boa parte dos fãs.

São quatro blocos de três episódios cada, fazendo um total de doze. Cada três episódios é como se fosse um filme, situado nos anos antes da Batalha de Yavin. Mas o problema é que, diferente da primeira temporada, aqui só parte é memorável. Temos alguns episódios esquecíveis. Resumindo muito resumidamente: os episódios 8, 9 e 10 são do nível da primeira temporada, mas o resto podia ser melhorado.

Vou seguir a sugestão do meu amigo e ex-companheiro de Podcrastinadores, Rod Montaleão, e fazer uma breve lista que melhoraria bastante esta temporada.

Claro, vou ter que entrar em spoilers. Vamulá?

1-Início chato: Acontece muito pouca coisa nos seis primeiros episódios. Entendo a ideia de se colocar cada bloco de três episódios com um intervalo de um ano entre eles, mas, ficou ruim. Era melhor uma temporada com nove episódios no total. Solução: editar esses seis episódios, cortar metade do material e transformá-los em três. Por exemplo, toda aquela parte do Cassian preso pelos “guerrilheiros trapalhões” em Yavin foi completamente desnecessária.

2-“Ordem errada”: Os episódios 8 e 9 são muito bons. O episódio 8, com o massacre em Ghorman, é sensacional e merece entrar em listas de melhores momentos de todo o Star Wars. O episódio 9, com o discurso e posterior fuga da Mon Mothma, não fica pra trás. Isso é tão bom que deveria ser o encerramento da série. O episódio 10 traz a morte do Luthen, outro bom episódio, mas, essa morte poderia ter acontecido antes do discurso da Mon Mothma, criando um crescente de tensões. Solução: trocar a ordem dos episódios, pra encerrar a série com a fuga da Mon Mothma (que inclusive pode ser diretamente ligado a o episódio S03E18 de Rebels).

3-Final com gancho: Todos sabemos que Andor é prequel para Rogue One. Então a série acabar com gancho pro filme nem é ruim. Mas é anti climático. Pra quem vai emendar Rogue One depois do último episódio, fica perfeito, mas deixa a série refém. Solução: altera aquele final cheio de ganchos pro filme.

Bailarina

Crítica – Bailarina

Sinopse (imdb): Uma assassina treinada nas tradições da organização Ruska Roma sai em busca de vingança após a morte do pai.

Não escondo de ninguém que sou fã dos filmes do John Wick. Vou além: gosto de quase todos os filmes feitos pela galera da 87North, produtora fundada por David Leitch, um dos nomes por trás do primeiro John Wick. Leitch é ex dublê, e hoje dirige e produz filmes de ação que valorizam o trabalho dos dublês, filmes como Atômica, Anônimo, Trem Bala e O Dublê.

E Bailarina ainda tinha outro atrativo: Ana de Armas. Lembro que ela teve uma breve participação no último James Bond, e que foi a melhor coisa daquele filme. Depois disso, fiquei na torcida pra um filme de ação com ela protagonista.

Tive um certo receio quando li quem era o diretor. Bailarina foi dirigido por Len Wiseman, que não tem um currículo muito bom (Anjos da Noite, Duro de Matar 4, a refilmagem de Vingador do Futuro…). Mas, segundo o imdb, Chad Stahelski – diretor dos quatro filmes do John Wick – reprovou o corte original e ficou entre dois e três meses em Praga refilmando boa parte do material feito por Wiseman.

E o resultado ficou muito bom. Bailarina não é um filme perfeito, mas é bem acima da média: é empolgante, bem coreografado, bem filmado, e Ana de Armas está excelente.

Bailarina se passa entre John Wick 3 e 4. Eve é resgatada, ainda criança, e levada para ser uma Ruska Roma e virar uma assassina. Acompanhamos seu treinamento e depois a vemos em ação. Até que resolve sair numa jornada de vingança.

Heu tive um problema que é parte minha incompetência, parte erro de casting. O filme começa com um flashback com a protagonista criança. Aparece o líder dos vilões, interpretado pelo Gabriel Byrne com muita maquiagem. Tanta maquiagem que achei que era o Ian McShane, gerente do Hotel Continental, presente em todos os filmes da franquia. O filme segue, ela vai embora com esse cara, e tempos depois diz que quer se vingar. Pensei, “ué, mas não foi ele que estava lá?” Aí mostra o personagem do Gabriel Byrne, e reparei que eram duas pessoas diferentes. Mas passei boa parte do filme confuso, achando que era o mesmo ator. Ok, parte da culpa é minha, sou um péssimo fisionomista. Mas, poxa, podiam ter colocado atores mais diferentes! Não só eles são parecidos como ainda têm postura semelhante.

Além disso, outra coisa me incomodou. Aprendemos nos outros filmes que o Hotel Continental está em trégua permanente. Se um cara com a cabeça a prêmio por 2 milhões está dentro do hotel, não pode ser assassinado. Mas aí aumentam pra 4 milhões e as pessoas resolvem ir matá-lo. Oi? Por que diabos aquelas pessoas foram até o quarto do cara e começaram a atirar???

Por fim, um mimimi. No treinamento da Eve, a treinadora fala que ela pode trapacear pra ganhar. Aí ela ganha de um cara com um chute no saco dele. Sério que querem dizer que o melhor que ela consegue é um truque sujo? Não seria bem melhor mostrar que ela venceu a luta porque é habilidosa, em vez de ter que apelar pra golpes baixos?

Relatei alguns problemas, mas achei o resultado de Bailarina bem acima da média. Como acontece nos quatro John Wick, são diversas sequências de lutas, e todas elas muito bem coreografadas. Dá gosto de ver cenas de luta assim!

Não acredito que vou falar agora seja spoiler, porque está no trailer e até no cartaz. Mas sim, aparece o próprio John Wick. E preciso dizer que tive sensações dúbias sobre a participação do Keanu Reeves. Porque por um lado é sempre legal vê-lo em ação; mas por outro, não precisava. Se você tirá-lo, o filme não perde nada. Seria um filme legal sem o “dono da franquia”.

No elenco, Ana de Armas está sensacional. Linda linda linda, e convence nas cenas de tiro porrada e bomba. Keanu Reeves, Ian McShane, Lance Reddick e Anjelica Huston voltam aos papéis que já tinham feito nos filmes da franquia. De novidade, temos Norman Reedus, Catalina Sandino Moreno e Gabriel Byrne (que não está mal, mas, como falei, deveria ser outro ator). E, prestem atenção, a concierge do hotel em Praga é Anne Parillaud, sim, a Nikita do filme de 1990!

Bailarina estreia esta semana nos cinemas. Boa opção pra quem gosta de filmes de ação. Claro que o filme termina com um gancho pra continuação. Que mantenham a qualidade e venham outros!

O Esquema Fenício

Crítica – O Esquema Fenício

Sinopse (imdb): Conto sombrio de espionagem que segue um relacionamento tenso entre pai e filha em uma empresa familiar. As reviravoltas giram em torno de traição e escolhas moralmente cinzentas.

E vamos para mais um Wes Anderson!

Vou copiar um parágrafo que escrevi ano passado, no texto sobre Asteroid City: “Wes Anderson é um dos poucos na Hollywood contemporânea que tem um estilo visual fácil de identificar. Seus filmes são sempre muito simétricos, cada frame é milimetricamente organizado, o cara deve ter TOC. As atuações são artificiais, mas isso parece proposital, e se encaixa bem na proposta visual.”

O Esquema Fenício (The Phoenician Scheme, no original) segue esse caminho. Tudo simétrico e com atuações robóticas. Claro que isso não agrada qualquer público, mas precisamos reconhecer que o cara tem um estilo característico.

Agora, se falei que Asteroid City era um filme onde pouca coisa acontecia, aqui é o oposto. O roteiro de Anderson com o habitual parceiro Roman Coppola traz uma trama complexa, onde os três personagens principais se deslocam entre vários núcleos, desenvolvendo diversas negociações confusas. Algumas são bem divertidas, como o “momento basquete”, mas outras parece que estão lá só pra ter espaço pra participações especiais no elenco.

Sim, como de costume, o elenco é fantástico. Acho curioso como Anderson consegue tantos atores famosos para os seus filmes, já que é um formato que não privilegia boas atuações. E O Esquema Fenício não é diferente. Os papéis principais são de Benicio Del Toro, Mia Threapleton e Michael Cera (Mia é a única do elenco que não é conhecida, mas ela é filha de uma tal de Kate Winslet). Dentre os coadjuvantes principais, temos Tom Hanks, Bryan Cranston, Benedict Cumberbatch, Scarlet Johansson, Jeffrey Wright e Riz Ahmed. E ainda tem pontas de Bill Murray, F Murray Abraham, Willem Dafoe, Rupert Friend, Charlotte Gainsbourg, Mathieu Amalric e Hope Davis. Sobre as atuações, os três principais até têm personagens interessantes. O resto é tudo apático.

O Esquema Fenício é extremamente bem filmado, e tem alguns momentos hilários (ri alto com as flechas do filho do protagonista). A trilha sonora de Alexandre Desplat (outro colaborador habitual) também é boa. Mas, precisamos reconhecer que é um entretenimento para poucos…

A Fonte da Juventude

Crítica – A Fonte da Juventude

Sinopse (imdb): Dois irmãos afastados unem forças para buscar a lendária Fonte da Juventude. Usando pistas históricas, eles embarcam em uma jornada épica repleta de aventuras. Se forem bem-sucedidos, a mítica fonte poderá lhes conceder a imortalidade.

Pensa num cara que trabalha muito. Entre 2019 e 2024, Guy Ritchie dirigiu seis longas e dois episódios de série. Lembro que um tempo atrás todo ano tinha filme do Woody Allen, mas eram filmes “pequenos”, com poucas locações e pouca produção, teoricamente mais fáceis. Ritchie fez Aladdin, Magnatas do Crime, Infiltrado, Esquema de Risco, O Pacto e Guerra sem Regras – nenhum filme “pequeno”.

Mais um ano, mais um filme. A Fonte da Juventude (Fountain of Youth, no original) é o sétimo longa dele em sete anos.

(Detalhe que heu coloquei outro projeto dele na minha lista de expectativas para 2025. Será que ele ainda lança mais um este ano?)

A Fonte da Juventude é um filme de aventura genérico seguindo a onda dos filmes do Indiana Jones, ou, A Lenda do Tesouro Perdido (que é um filme que se passa nos dias atuais). Um caçador de antiguidades, meio estudioso, meio mercenário, chama sua irmã, que trabalha em um museu, para formar um time que vai procurar a fonte da juventude, tudo bancado por um bilionário doente. Enquanto isso, uma misteriosa mulher tenta impedi-lo.

Sou fã do Guy Ritchie, vi quase todos os seus filmes (só não vi o que ele fez com a Madonna), vou continuar vendo, mas… A Fonte da Juventude nem parece feito por ele. É bem filmado, mas é tão genérico que qualquer diretor poderia ter feito. (E esse problema aconteceu algumas vezes nos últimos anos…)

Tem outro problema, aliás, bem parecido com o que acontece em Guerra Sem Regras. O filme começa bem, mas lá pelo terço final o roteiro se perde e o filme não termina tão bem assim. Aqui, rola um tiroteio meio sem sentido, alguns personagens têm atitudes meio forçadas, e achei muito over existirem steel drums dentro de uma pirâmide há 3 mil anos (o instrumento foi criado em Trinidad e Tobago há menos de 200 anos!).

Como acontece frequentemente em filmes de streaming, A Fonte da Juventude tem três nomes grandes encabeçando o elenco: John Krasinski, Natalie Portman e Eiza González. E ainda tem o Domhnall Gleeson num papel grande e o Stanley Tucci numa ponta. Bom elenco, mas é daquele tipo de filme que não exige muito dos atores.

Agora, talvez fosse melhor se o Guy Ritchie fizesse menos filmes mas focasse mais na qualidade deles. Desses sete dos últimos anos, gosto muito de dois (Magnatas do Crime e Infiltrados), mas tenho reticências com os outros cinco.

Sim, o filme tem uma queda no meio, sim, Guy Ritchie já fez coisa melhor, mas, pelo menos, o resultado não ficou muito ruim. Tecnicamente o filme é bem feito, os atores são bons, e a gente é levado pela trama. Acredito que quem for assistir sem grandes expectativas pode se divertir por duas horas. Só fica aquela sensação de que podia ter sido bem melhor…

The Ugly Stepsister

Crítica – The Ugly Stepsister

Sinopse (imdb): Elvira luta contra sua linda meia-irmã em um reino onde a beleza reina suprema. Ela recorre a medidas extremas para cativar o príncipe, em meio a uma competição implacável pela perfeição física.

Nos últimos anos estamos vivendo uma onda de adaptações de terror pra histórias infantis. O terror do Ursinho Puff foi um grande sucesso comercial (deve ter custado duas mariolas e uma Coca Cola, qualquer 10 mil dólares de lucro é um resultado excelente), e isso abriu a porteira pra vários filmes bem ruins. Só aqui comentei sobre dois filmes do Mickey, um da Alice, um do Popeye, e dois da Cinderela – um é tosco mas pode ser divertido dependendo do seu espírito, mas o outro é ruim ruim.

The Ugly Stepsister certamente vai surfar essa onda, mas é um filme bem diferente. Filme norueguês, tem uma produção bem cuidada, boas atuações e uma história fora do óbvio. Não é um slasher tosco usando o conto de fadas como pano de fundo, e sim um body horror que lembra mais o clima de A Substância.

Longa de estreia da diretora e roteirista norueguesa Emilie Blichfeldt, The Ugly Stepsister conta a história da Cinderela. Não, não tem uma história alterada levando a Cinderela a uma jornada de vingança, como os dois filmes do ano passado. É a história que todos conhecemos. Mas, sob outro ponto de vista: o da irmã, da filha da madrasta.

(Não sei como seria o termo em português. “Stepsister” não é exatamente igual a “meia irmã”, uma meia irmã tem ou o pai ou a mãe em comum. Não sei se existe este termo na língua portuguesa.)

Elvira, filha mais velha da madrasta de Agnes (que vai virar Cinderela), é feia e está acima do peso. Quando o príncipe anuncia um baile pra daqui a quatro meses, sua mãe coloca Elvira sob vários tratamentos severos para ficar bonita e impressionar o príncipe.

The Ugly Stepsister só é terror pelo visual grotesco e cheio de gore, porque no fundo está mais próximo do drama. Elvira se submete a coisas terríveis pra tentar alcançar seu sonho – ou, às vezes, parece até ser o sonho de sua mãe. E o filme traz algumas cenas visualmente bem fortes. Dificilmente o espectador não vai se retorcer em algum momento do filme.

Outra coisa que é bom avisar é que estamos diante de um filme europeu, que mostra a nudez e o sexo de maneira bem diferente do cinema americano. Na verdade são poucas cenas, mas essas poucas cenas mostram bem mais do que vemos no cinemão hollywoodiano.

Falei que é mais drama do que terror porque acompanhamos o sofrimento da Elvira. E ela realmente sofre. A atriz Lea Myren está bem – aliás, o elenco todo funciona. Outro ponto a ser destacado são os cenários e figurinos da época. O filme não especifica exatamente quando se passa, mas sabemos que não é uma história dos dias de hoje, e nada parece falso.

Vou fazer um comentário agora, mas é head canon meu, não é problema do filme. Quando o pai da Cinderela morre, achei que o filme ia torná-la em uma vilã. Isso seria uma boa história: uma Cinderela malvada e uma irmã vítima. Mas este não é o filme da Emilie Blichfeldt, então não é uma crítica.

The Ugly Stepsister é um filme da Shudder e ainda não está disponível em nenhum streaming brasileiro. Bem que podia ter Shudder aqui…

Lilo & Stitch

Crítica – Lilo & Stitch

Sinopse (imdb): Uma menina havaiana solitária faz amizade com um alienígena fugitivo, ajudando a remendar sua família fragmentada.

É complicado falar de um filme como Lilo & Stitch. Porque é divertido e engraçado, e o Stitch é fofinho, então certamente vai agradar o público. Mas, por outro lado, é exatamente igual ao desenho de 2002. Ou seja, é divertido, mas na verdade é um prato requentado.

A Disney errou muito nas adaptações live action, quase todos os filmes são ruins ou péssimos – na minha humilde opinião, o único bom é Cruella, que não é uma versão de 101 Dálmatas e sim uma história independente usando a personagem. Todo o resto é sofrível, e o último a ser lançado, Branca de Neve, foi ruim com força. Olhando sob este ângulo, Lilo & Stitch nem é tão ruim.

Tem uma coisa que merece elogios, que é a animação do Stitch. Acho que só teve uma cena onde reparei falhas na interação com os personagens humanos – uma cena no fim onde as irmãs abraçam o Stitch e dá pra ver pelos braços delas que estão abraçando o ar. Porque em todo o resto do filme, parecia um bicho real. Devem ter colocado um Stitch de pelúcia em tamanho real interagindo com o elenco de carne e osso. O efeito especial é realmente bem feito.

Aproveitando o elogio, preciso dizer que o roteiro teve uma pequena alteração positiva. No desenho, os alienígenas que vêm pra Terra pra tentar capturar o Stitch se vestem como humanos e ficam no meio das pessoas e ninguém repara que são alienígenas. Isso era meio tosco no desenho, e aqui foi consertado, agora eles usam uma camuflagem e se parecem com humanos.

Mas fora isso, tudo é igual ao original. Bonitinho, fofinho… e repetido.

Preciso comentar sobre a dublagem. A sessão de imprensa foi anunciada legendada, mas na hora exibiram o filme dublado. E a atriz que faz a Lilo, a estreante Maia Kealoha, foi prejudicada pela dublagem. Me parece que é uma boa atriz mirim, mas em várias cenas ela soou artificial.

Aproveito pra falar do elenco. Maia Kealoha e Sydney Agudong interpretam as irmãs. Chris Sanders, diretor do desenho original, volta a fazer a voz do Stitch (repetindo o papel, ele fez o mesmo em 2002). Tia Carrere e Jason Scott Lee estavam no desenho, e voltam aqui com outros personagens. Zach Galifianakis e Billy Magnussen fazem as versões humanas dos alienígenas, e estão bem caricatos, mas funcionam no estilo do filme. E fiquei com pena de não ter ouvido a voz da Hannah Waddingham porque era a versão dublada.

Lilo & Stitch vai agradar, vai vender ingresso, vai levar pessoas ao cinema, e isso é algo sempre positivo. E por isso vou me contradizer. Sim, é um prato requentado, e o desenho original está no Disney+. Mas é sempre positivo ver alguém deixando o streaming e indo ao cinema. Por este motivo, apesar de não ter nenhuma novidade, torço por mais projetos como esse.

Missão: Impossível – O Acerto Final

Missão: Impossível – O Acerto Final

Sinopse (imdb): Ethan e sua equipe estão em uma missão para encontrar e destruir uma IA conhecida como A Entidade. A viagem ao redor do mundo dá origem a cenas de ação incríveis e mais de uma reviravolta inesperada.

E vamos ao oitavo filme de uma franquia que não tem nenhum filme ruim!

Hoje, em 2025, nem todos se lembram, mas Missão Impossível era um seriado, que durou sete temporadas, entre 1966 e 1973, e que teve um remake em 1988 com duas temporadas. Até que em 1996, Tom Cruise assumiu o papel principal da versão cinematográfica e transformou cada novo filme em um grande evento, e, principalmente, em um “evento Tom Cruise”. E agora, Missão: Impossível – O Acerto Final (Mission: Impossible – The Final Reckoning, no original) tem cara de encerramento da franquia, incluindo citações a vários elementos de outros filmes da saga. Será que Tom Cruise, hoje com 62 anos, ainda teria pique pra seguir com a série?

(Ok, sabemos que Hollywood é movida por dinheiro, então claro que pode aparecer um novo filme onde o Ethan Hunt do Tom Cruise se aposenta e “passa o bastão” para outro agente mais novo. Mas acredito que vai ser uma barra difícil de segurar, seja quem for o novo protagonista.)

A direção ficou mais uma vez com Christopher McQuarrie, que dirigiu os três anteriores (os quatro primeiros filmes foram de quatro diretores diferentes). McQuarrie tem uma sólida parceria com Cruise, não só dirigiu quatro Missão Impossível e o Jack Reacher de 2012, como também estava no roteiro de No Limite do Amanhã, A Múmia e Top Gun Maverick. McQuarrie entrega um bom resultado, este oitavo filme pode não ser tão bom quanto o sétimo, mas duvido que alguém saia do cinema decepcionado.

Como já virou tradição, Missão: Impossível – O Acerto Final tem longas sequências de ação de tirar o fôlego, e sempre com o Tom Cruise dispensando o dublê. Aqui são duas sequências, uma em um submarino; outra em pequenos aviões monomotores. Ok, sempre vai ter alguém dizendo “mas duvido que o Tom Cruise estivesse fazendo aquilo tudo, ele estaria preso por cabos de segurança”. Sim, sim, como qualquer cena executada por um dublê, existem alguns artifícios usados para minimizar os riscos que o profissional pode correr. Mas mesmo assim, desafio qualquer leitor deste site: você conseguiria fazer aquela cena?

(Sei que o nome do filme é “Missão Impossível”, e já vimos diversas situações absurdas vividas pelo protagonista. Mas talvez o final da sequência do submarino seja a mentira mais mentirosa de toda a saga…)

Agora, se por um lado essas duas sequências valem o filme, por outro lado o roteiro poderia ser mais enxuto. São quase três horas de filme, e com MUITAS explicações. O filme é tão confuso que dá vontade de ver outra sessão pra tentar pegar todos os detalhes, mas é tão cansativo que não dá vontade de rever.

(Mas reconheço que gostei da dinâmica de algumas cenas que misturam diálogos e ações em dois locais diferentes. Sabe aquela parada de uma pessoa terminar a frase que a outra começou? Desse jeito, mas misturando cenas distintas.)

Pra piorar, o vilão não é bom. Existe o vilão principal, a Entidade, que é uma IA, então é um vilão invisível. E existe o vilão secundário do Esai Morales, que é caricato e não assusta nada.

Agora, depois que passamos pelas sequências de ação, a gente até esquece as falhas. Porque precisamos lembrar que a qualidade dos filmes da franquia é muito alta. Este oitavo filme pode não ser um dos melhores, mas está acima da média do cinema de ação contemporâneo. E ambas as sequências são sensacionais. Sim, vale pagar o ingresso caro do cinema, nem que seja só pra ver as duas sequências.

Sobre o elenco, indubitavelmente é um “filme do Tom Cruise”, e ele não decepciona. Mas outros atores também têm espaço (afinal são duas horas e quarenta e nove minutos de filme!). Ving Rhames, Simon Pegg, Hayley Atwell e Pom Klementieff voltam aos seus papéis como a equipe que ajuda o herói (tem mais um membro, Degas, interpretado por Greg Tarzan Davis, mas o roteiro não o privilegiou, é um personagem desnecessário). E, como falei antes, não gostei do Esai Morales. Dentre as novidades, gostei de dois personagens interpretados por atores mais conhecidos por séries de TV: Hannah Waddingham (Ted Lasso) e Tramell Tillman (Ruptura).

Ainda queria falar da trilha sonora. Gosto muito do tema original, em 5/4. Uns anos atrás fiz um short falando de músicas em 5/4. Quase todas as músicas que ouvimos por aí são em 4/4, que é quando tem um tempo forte a cada quatro tempos, UM dois três quatro UM dois três quatro… O tema de Missão Impossível tem um tempo forte a cada cinco: UM dois três quatro cinco UM dois três quatro cinco. O tema de Halloween também é em 5/4. Você já tinha reparado neste detalhe?

Por fim, temos uma cena em um porta aviões. Caramba, podia ter uma piadinha interna, onde Ethan Hunt podia avistar, ao longe, o Maverick!